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| filme 111 | GRAVIDADE
As apostas de Alfonso Cuarón
sempre foram as menos óbvias. Nascido na Cidade do México, em 1961, aos 34 anos
iniciou o que parecia ser uma bem sucedida carreira em Hollywood. Dirigiu dois
filmes de grandes estúdios com relativo sucesso de público e grande sucesso de
crítica: A Princesinha e Grandes Esperanças. A aposta no menos óbvio veio
quando ele decidiu voltar ao México para dirigir e produzir o que até hoje é o
maior sucesso cinematográfico do país: o drama Y Tu Mamá También. Depois disso,
parecia inevitável não sucumbir aos apelos americanos. Foi convidado e dirigiu
o terceiro filme da série Harry Potter, além de um dos melhores filmes de 2006:
um drama futurista e apocalíptico chamado Filhos da Esperança. No auge da
carreira escolheu a reclusão, saiu dos grandes projetos por longos sete anos
até reaparecer com esse incrível Gravidade.
A história do astronauta Matt
Kowalski (George Clooney) em sua última missão fora da Terra (consertar o
telescópio Hubble) e da doutora Ryan Stone (Sandra Bullock) que o acompanha na
missão, juntamente com outros membros da Nasa, parece ser simples mas estamos
falando de Cuarón, o homem que foge do óbvio. O que parecia terreno fértil para
diálogos repletos de coordenadas e terminologias técnicas vira um oásis de
sons, enquadramentos surpreendentes e diálogos que dizem muito mais sobre nós
mesmos do que os papos que temos em terra firme.
Uma chuva de destroços de um
satélite provoca um acidente que deixa Matt e Ryan à deriva, reféns da única
coisa que existe de fato num ambiente espacial: a gravidade. O silêncio do nada
que existe fora das roupas de astronauta toma a sala de cinema e nos joga em
pleno espaço sideral, também reféns da gravidade. Um bravo Matt contrasta com
uma titubeante Ryan, uma mulher que já passou por tantas provações na vida
quantas são necessárias para fazer parecer libertador uma odisseia no espaço. As
tomadas sem diálogo são tão sensacionais e especiais que tornam aula esse
roteiro feito para ser cinema – o auge da imagem trabalhada esteticamente. Em
pleno espaço, estafada de tanto lutar, a doutora Ryan se coloca em posição
fetal, como que dali por diante houvesse dentro dela e na narrativa do filme o
renascimento. Cinema puro. Imagem que diz mais do que mil palavras.
O esforço físico feito pela dupla
de astros é impressionante. Sandra Bullock tem 49 anos e um corpo simplesmente
perfeito. O crescimento da coragem e da força da personagem são extremamente
bem marcados e servem para conduzir a narrativa. Sandra leva o filme de tal
forma que até nossa respiração faz eco com a dela.
Talvez, Gravidade fique
perdido entre os excelentes filmes do novo século ou talvez se torne o novo
2001 – Uma Odisseia no Espaço (muito menos pelo tema e mais por ter conseguido
empregar uma estética intimista para um filme de ficção científica, em 2001 uma
ode sobre a força da mente e a loucura, em Gravidade uma forma de renascer
quando só existe o vazio de tudo), o que seria, de fato, merecido. Não seria
esperar muito uma enxurrada de indicações aos principais prêmios do cinema em
2014. Seria óbvio, ao contrário de Alfonso. Que ele não suma por mais sete
anos. É talento demais para ficar escondido.