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| filme 116 | TRAPAÇA


Aquilo que vemos nem sempre é o real.



Em 2013, David O. Russel decidiu fazer uma comédia romântica que acabou resultando num sucesso de público e crítica, concedendo à Jennifer Lawrence o status de nova diva do cinema americano. Vitoriosa no Oscar de 2013, Jennifer ainda viu seu parceiro de cena, Bradley Cooper, ser indicado para estatueta de melhor ator. Pois a dupla do sucesso O Lado Bom da Vida está de volta nessa comédia dramática sobre um casal de trapaceiros que sonha em viver uma vida inteira de trapaças. Dessa vez, porém, a dupla de queridinhos do diretor aparece como coadjuvante de outra dupla, também cheia de química. Amy Adams e Christian Bale são os motores do filme. Ambos indicados ao Oscar de suas respectivas categorias. 

Inspirado em fatos reais o filme conta a história de uma dupla de vigaristas que é recrutada pelo FBI para tentar flagrar congressistas americanos aceitando suborno. A operação real aconteceu em 1978, mesma época em que se passa o filme. Irving Rosenfeld e Sydney Prosser veem seus dias de trapaça chegar ao fim, quando são pegos pelo agente Richie DiMaso em pleno trambique. Numa jogada secreta, recebem a proposta de colaborar com os “mocinhos” para conseguirem ter a ficha limpa. Aceitam. E aí o filme começa. Irving é apaixonado por Sydney, mas é casado com a transloucada Rosalyn. A relação explosiva com a esposa quase coloca a tentativa de redenção de Irving a perder. Em mais de duas horas de filme, recheados de reviravoltas, vemos o desfile de exageros que já é lugar comum nas produções de David. Todos os problemas de relacionamento e comportamento são aumentados propositalmente, para serem explorados em tom jocoso, receita de sucesso desde a época de Três Reis, passando pelo ótimo O Vencedor.

A qualidade do que vemos é indiscutível. Trilha sonora afiada, com inúmeros sucessos da década de 70. Figurinos fantásticos, explorando a beleza e o charme das quatro estrelas principais. A direção de arte e cenários também são destaque, ressaltando todo o estilo retrô dos móveis e texturas da época. Não por acaso o filme foi indicado ao Oscar de figurino e direção de arte. Mas é na direção de atores que David se destaca. Ano passado ele conseguiu a proeza de fazer seus quatro atores principais serem indicados à estatueta mais famosa do cinema (Jennifer, Bradley, Robert de Niro e Jacki Weaver concorreram aos prêmios de interpretação), fato que não ocorria desde 1981. Como se fosse pouco, o diretor conseguiu repetir o feito um ano depois. Jennifer Lawrence é favoritíssima para levar o prêmio de melhor atriz coadjuvante. Ela está simplesmente fantástica. É a protagonista das melhores cenas do filme: um duelo quentíssimo com Amy Adams num banheiro, um acerto de contas pra lá de surreal com Christian Bale já na parte final do filme e um desfile de sensualidade num momento chave da projeção. Christian Bale é outro que dispensa comentários. Engordou mais de 20kg para fazer Irving e empresta doçura e loucura a um trambiqueiro que usa ternos de veludo e passa cola no cabelo (numa sequência de abertura das mais engraçadas). Amy Adams tem um papel em que pode desfilar toda sua beleza e um ar blasé dos mais poderosos, sua má sorte é que este ano Cate Blanchet parece que não tem concorrentes por sua interpretação em Blue Jasmine. Bradley faz um policial dominado pela ambição, cheio de manias e completamente preocupado com a sua imagem.

Trapaça não é só um filme de reviravoltas, ou entretenimento puro. Toca em temas cruciais, o maior deles a nossa vontade de querer parecer o que não somos diante de certas situações da vida. A busca pelo dinheiro, a adrenalina da conquista, a ambição desmedida, que muitas vezes nos desvia e cria uma capa que apaga o que temos de bom deixando, somente, coisas negativas a mostra. Sem moralismos, sem querer parecer dono da verdade, com ótimos diálogos, o roteiro conduzido por David nos leva a uma divertida viagem onde dá o maior prazer torcer pelos trapaceiros. 

Trapaça foi indicado para dez Oscar: melhor filme, roteiro, edição, direção de arte, figurino, diretor, atriz, ator, atriz coadjuvante e ator coadjuvante.
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Renata Jamús
É uma apaixonada por cinema. Foi mestre em "discursos do Oscar" na infância. Teve três ou quatro muito bons, que eram constantemente lidos para os pais babões de plantão. Os mitos hollywodianos eram como amigos da rua. Habitavam sua casa, desde sempre. | COLEÇÃO DE FILMES | FACEBOOK | TWITTER