banner

| filme 41 | MELHOR É IMPOSSÍVEL

Saber viver com aquilo que temos para viver.

- Todos temos histórias terríveis a superar, e...
- Não é verdade. Alguns têm histórias legais, bonitas que acontecem em lagos com barcos e amigos e salada de macarrão. Só que ninguém neste carro. Mas muita gente. É a história deles. Os bons tempos e salada de macarrão. O pior não é ter tido dificuldades é você estar puto porque os outros têm tudo fácil.

Um gênio do cinema mais dois atores ótimos, duelando para ver quem está melhor, neste drama com toques de comédia do diretor James L. Brooks. Jack Nicholson, o gênio, ganhou sua 2 estatueta do Oscar de melhor ator com o atormentado escritor Melvin Udall, um sarcástico e ironico homem de meia idade que sofre de transtorno obsessivo compulsivo. Helen Hunt, também vencedora do Oscar de melhor atriz por esse filme, interpreta a garçonete Carol Connelly, uma sofrida mãe solteira que tenta ver graça na vida. Fechando o trio, temos Greg Kinnear, que foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante, interpretando um artista gay, chamado Simon, que se transforma em fio condutor da história.

Melvin é um sujeito atormentado por uma doença. Vive recluso, odeia todo mundo, briga com vizinhos, usa as palavras da maneira mais cruel possível e, numa deliciosa contradição, começa o filme escrevendo sobre o amor. Ele vive uma relação conturbada com Simon, seu vizinho. Um dia vai comer no restaurante de sempre e começa a conversar com a garçonete Carol. Num primeiro momento, fala coisas horríveis para ela. Depois começa a se apaixonar. A vida de Melvin toma novo rumo a partir do momento em que, contra a sua vontade, começa a cuidar do cachorro do seu vizinho. Além disso, ele não consegue mais ficar sem ver Carol, o sentimento que surge entre eles é o remédio que Melvin necessita.

- Não entendo este lugar. Me fazem comprar paletó, e você entra com um vestido caseiro. Não entendo. O que foi? Espere, o que foi? Aonde vai? O que foi? Eu não quis ofender. Sente-se. Pode me olhar com desprezo, mas sente-se.
- Me faça um elogio, Melvin. Eu preciso de um. Rápido. Você não faz idéia de como me magoou.
- No momento em que as pessoas vêem que precisam de você elas ameaçam ir embora.
- Elogio é dizer algo agradável sobre alguém. Agora ou nunca. Com intenção.
- Agora, vou te fazer um grande elogio e é verdade.
- Tenho medo de que diga algo horrível.
- Não seja pessimista. Não é seu estilo. Ok. Vou dizer. Embora seja um erro. Eu tenho uma doença. Meu médico, um psiquiatra que me tratava disse que em 50% ou
60% dos casos um comprimido resolve. Odeio comprimidos. São coisas perigosas. Odeio! Estou usando a palavra "ódio" para comprimidos. Odeio. O meu elogio é na noite em que você foi lá e disse que jamais... Bem, você estava lá. Você sabe o que disse. O meu elogio a você é que no dia seguinte, eu comecei a tomar os comprimidos.
- Não entendo como isso possa ser um elogio.
- Você me faz querer ser um homem melhor.

A união dos três personagens centrais numa viagem para que Simon peça ajuda aos pais é um divisor de águas na vida de cada um. Quando descobrimos com clareza nossa posição no Mundo ficamos mais tranquilos e menos rancorosos para a vida. É uma frase dita por Melvin que coloca todos os três no lugar que eles realmente ocupam. Ao invés de ter um efeito negativo, o diálogo abre os olhos de todos os três e faz com que eles se permitam a vida que tem que viver, sem maiores sonhos ou promessas. Falar sobre pessoas normais, que não vivem em histórias de conto de fadas, por sinal, é tarefa que o diretor James L. Brooks sabe fazer muito bem, um outro grande filme tem esse mesmo mote, o drama Encontros e Desencontros, com Bull Murray e Scarlett Johansson (dirigido por Sofia Coppola).

Melvin – Eu quero te fazer um elogio.
Carol – Quer saber…
Melvin – Me deixe falar. É que… eu devo ser a única pessoa na face da terra que conhece a melhor mulher do mundo. Eu devo ser o único que reconhece como você é especial em cada coisa que faz. Em como você é com Spencer. Spence. Em cada pensamento que você tem, como diz o que sente e como quase sempre diz algo que tem a ver com ser franca e bondosa. A maioria das pessoas não percebe isso em você. E eu me pergunto como podem te olhar trazendo comida, limpando a mesa, sem saberem que conheceram a melhor mulher do mundo. E o fato de eu saber isso me faz sentir bem comigo mesmo.

Jack Nicholson constrói um Melvin adorável. O homem que odiamos com todas as forças, no início do filme, vai consquistando nossos corações. Ao mesmo tempo que ele arranca sorrisos e suspiros dentro do filme, vai arrancando sorrisos e suspiros da gente também. As manias, consequência da doença que possui, deixam de ser irritantes e passam a ter graça: abrir e fechar protas três vezes, pular as rachaduras das calçadas, todas elas ganham um novo olhar. A tentativa de melhorar já é um alento na vida do Melvin, daqueles que o cercam e passa a ser suficiente para que passemos a gostar dele. Aliás, a tentativa que alguém faz em melhorar (melhorar por amor ou por necessidade), seja lá no que for, já deveria ser suficiente para a própria pessoa e para os que estão em volta. O filme fala disso: resignação com aquilo que temos para viver e tentar ser melhor sempre, dentro do que está destinado para nós. Não estamos falando em ficar conformado com pouco, mas em ter a noção que melhor que isso não dá. É impossível.
Compartilhe:
Renata Jamús
É uma apaixonada por cinema. Foi mestre em "discursos do Oscar" na infância. Teve três ou quatro muito bons, que eram constantemente lidos para os pais babões de plantão. Os mitos hollywodianos eram como amigos da rua. Habitavam sua casa, desde sempre. | COLEÇÃO DE FILMES | FACEBOOK | TWITTER