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| filme 67 | PERFUME DE MULHER
É incrível, mas Perfume de Mulher guarda muitas semelhanças com o filme anterior, Um Sonho de Liberdade. Personagens principais com a mesma necessidade de redenção. Uma dupla inesperada que descobre um sentimento verdadeiro de amizade, compreensão e respeito. Uma jornada de descobertas. Em Um Sonho de Liberdade a jornada era dentro de uma penitenciária. Aqui, a jornada é na cidade de Nova York.
O tenente-coronel Frank Slade esntregou-se à solidão e à revolta, depois de ter ficado cego num acidente no quartel onde servia. O filme começa e vemos a vida atual do militar: ele mora isolado, num quarto, na casa da sobrinha. A relação deles dois é péssima. O melhor amigo do Frank é seu copo de whisky (muita gente vai achar a frase poética). Com viagem marcada para o feriado de Ação de Graças, a sobrinha de Frank tenta levá-lo. Em vão. Então, coloca um anúncio no jornal para tenatr arranjar alguém que tome conta do tio enquanto está viajando. Charlie é o candidato único. O primeiro contato é de estranhamento total. O velho militar, cansado da vida, expulsa o seu cuidador aos pontapés. Charlie, porém, é duro na queda. Decide ficar. É então que ele descobre os planos de Frank: passar dias em Nova York, curtindo todas, como se fosse uma despedida da vida.
Frank – Eu tive muitas experiências, sabe? Houve uma época em que podia ver. E vi garotos como estes, até mais jovens que estes, com os braços arrancados, as pernas esmagadas. Mas nada é mais triste que ter um espírito amputado. Para isso não há prótese. Pensam que estão apenas mandando este esplêndido soldado para casa com o rabo entre as pernas, mas eu digo que estão executando a alma dele. (…)
Mr Task – Sente-se, Sr. Slade
Frank – Eu não terminei. Quando entrei aqui ouvi as palavras, “berço de líderes”. Pois bem, quando o galho quebra, o berço cai. E caiu aqui. Forjadores de homens, criadores de líderes, cuidado com o tipo de líderes que estão formando. Eu não sei se Charlie fez bem ou mal em se calar. Eu não sou juiz ou júri. Mas posso dizer uma coisa a vocês: ele não trairá ninguém para garantir o seu futuro. E isso, meus amigos, se chama integridade. Se chama coragem. É disso que os líderes deveriam ser feitos. Eu enfrentei encruzilhadas na minha vida. Sempre soube qual era o caminho certo a seguir. Sem exceção, eu sabia. Mas nunca o segui. Sabem por quê? Por que era difícil demais. Agora aqui está o Charlie. Ele chegou a uma encruzilhada. Ele escolheu um caminho. É o caminho certo. É um caminho feito de princípios que formam o caráter. Deixem que ele continue sua jornada. O futuro deste menino está nas mãos de vocês. É um futuro valioso. Acreditem. Não o destruam. Protejam. Abracem. Um dia vão se orgulhar. Eu juro.
O cinema americano sempre trouxe grandes duplas de protagonistas em seus filmes. Talvez por coincidência, talvez por ser uma técnica de roteiro válida, a verdade é que são muitos os casos de personagens que são tese e antítese. Essa dialética também é perceptível nas escolhas dos atores. Aqui, temos um vulcão chamado Al Pacino. Possivelmente no papel da sua vida (ganhou o Oscar de Melhor Ator pela atuação no filme. Foi aplaudido de pé no dia da premiação). Ele de fato é cego. Tudo está correto. Além disso, a amargura, o ódio do Mundo que o seu personagem carrega chegam até o público de forma perfeita, sem qualquer caricatura. Um show! Já Chris O'Donnell é o oposto ideal. Do rosto, doce, passando pela construção de um personagem ingênuo (no que de positiva tem a palavra), porém firme nos seus princípios até chegar ao tom certo, de voz e expressão corporal. Contido e sentimental.
Além da cena do tango, que fez a fama da partner de Al Pacino, Gabrielle Anwar, outro momento fantástico marca o filme: o cego Frank dirigindo uma Ferrari pelas ruas de Nova York. Viver é isso aí!
É, porém, na relação entre Frank e Charlie que o filme ganha força. A amizade que surge e que salva a vida do velho ranzinza. E que, de certa forma, solidifica o caráter resoluto do jovem estudante. Uma amizade separada por idades tão diferentes, pelas vidas completamente inconciliáveis, mas que resiste, bravamente, amparada pela força da troca, da completude. O que sobra em um, falta no outro. E é assim que ambos seguem. Depois de uma final de semana que mudou tudo, para sempre.