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| filme 26 | O CAÇADOR DE PIPAS

É libertador consertar o passado!

- Alô?
- Amir Jan.
- Rahim Khan?
- Gentileza sua lembrar-se. Sinto saudades, Amir Jan. É bom ouvir a sua voz. Deveria voltar para casa.
- Casa? Não sei se é uma boa hora. A hora é péssima.
- Deveria vir. Existe uma forma de melhorar novamente, Amir.

Para gostar ou não do Caçador de Pipas precisamos saber como vamos encarar a produção. Se olharmos para o filme tentando enxergar as mazelas do Afeganistão (onde se passa uma boa parte da narrativa) ficaremos uma pouco decepcionados. Se formos encarar a película tentando absorver as lições sobre coragem, fidelidade e gratidão teremos um bom filme.

Baseado no livro de grande sucesso do escritor nascido no Afeganistão, o afegão Khaled Hosseini, o filme narra a vida do jovem Amir. A ação ocorre durante a década de 70, do século passado, perpassando pela invasão da União Soviética em 1979 e a posterior intervenção americana no início do ano 2000 para a derrubada do regime talibã até os tempos atuais. Amir tem como melhor amigo o garoto Hassan, pertencente a etnia hazarae (considerada inferior), e apesar de tratá-lo como um igual sofre por não possuir a coragem e nobreza de caráter do amigo.

- Bravo! Bravo, chefe Amir! Você o cortou!
- Ganhamos! Ganhamos!
- Amir, vou pegar aquela pipa azul para você.
- Hassan! Volte com ela!
- Por você, faria isso mil vezes!

Quando envereda pelo terreno da relação entre Amir e Hassan, o filme consegue ser extremamente interessante. O primeiro é uma criança temerosa. Teme o pai, teme assumir suas vontades (gosta de escrever), teme assumir que não se sente pertencente ao Afeganistão. Já o segundo possui coragem de sobra, segue as tradições sem se sentir preso a elas e está em paz com seu destino.

Após a invasão da U.R.S.S em 1979, Amir e o pai vão para os EUA. Após anos e anos, e já crescido, Amir recebe um chamado vindo do seu país de origem. Ao atender o chamado começa sua jornada para revisitar um país que parou no tempo (e o filme faz  questão de ressaltar a diferença entre ocidente e oriente, tomando um claro partido do primeiro), além de tentar eliminar os traumas do passado. Ainda que os afegãos não sejam plenamente livres, Amir, ao menos, tenta buscar a sua liberdade.

- Pense por favor. Tudo o que o homem tinha então era sua honra, seu nome. E se as pessoas
começassem a falar...
- Ele mentiu pra mim.
- Ele mentiu para vocês dois. E agora existe uma maneira de voltar a ser bom. Em nome de Deus misericordioso e de compaixão.

Deve ser complicado forjar o seu caráter e sua estrutura de valores longe da sua terra. Amir tinha apenas o seu pai como referência. Meu avô materno saiu do Líbano ainda muito novo. Veio com duas irmãs, uma foi para a Argentina e deu origem a toda uma linha familiar da qual muito me orgulho e sinto enormes saudades todos os dias. A outra irmã se estabeleceu em Niterói, com meu avô, e juntos começaram a formar uma família aqui. Fico imaginando como deve ter sido difícil para essas três pessoas deixarem pra trás todas as suas relíquias sentimentais. Talvez o filme tivesse sido melhor se explorasse esse lado da história de Amir. O livro consegue fazer isso, o filme não conseguiu tanto. Ainda assim, é interessante ver o reencontro do personagem principal com seu passado e a forma como ele fica em paz com tantos fatos que o atormentavam desde quando era criança. Seria legal se todos nós pudéssemos ter a chance que o Amir teve.
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Renata Jamús
É uma apaixonada por cinema. Foi mestre em "discursos do Oscar" na infância. Teve três ou quatro muito bons, que eram constantemente lidos para os pais babões de plantão. Os mitos hollywodianos eram como amigos da rua. Habitavam sua casa, desde sempre. | COLEÇÃO DE FILMES | FACEBOOK | TWITTER